Homenagem às Lojas de Rock de Brasília: Os Templos do Underground Candango

Conic, o templo da perdição

Por: Amarildo Adriano

Em uma época em que o acesso à cultura underground era um desafio épico, as lojas de rock de Brasília surgiram como verdadeiros oásis em meio ao deserto musical que era a capital nos anos 80 e 90. Estas lojas foram mais do que simples pontos de venda: eram templos da resistência cultural, conectando jovens a um mundo de música, ideias e possibilidades.

Sem internet, redes sociais ou meios de comunicação dedicados à cena alternativa, tudo — discos, revistas, notícias e demos — chegava às mãos dos fãs através desses visionários empreendedores que ousaram desbravar o desconhecido. Essas lojas não apenas abasteciam a paixão pela música, mas também funcionavam como pontos de encontro, onde amizades se formavam, bandas nasciam e a chama do underground candango era alimentada.


Rock House (110 Sul): A Pioneira

A Rock House foi a primeira loja especializada em rock de Brasília, abrindo suas portas por volta de 1986/87 na galeria do Cine Karim, na 110 Sul. Para muitos, visitar a Rock House era uma aventura. Jovens do Gama e de outras cidades satélites enfrentavam ônibus lotados e a travessia perigosa do “Eixão da Morte” para chegar ao epicentro do metal brasiliense.

A Rock House se destacou ao trazer discos importados e os icônicos picture discs, uma novidade na época. Para quem não podia comprar, a loja oferecia a possibilidade de gravar fitas cassete, que se tornavam verdadeiras joias compartilhadas por toda a galera. Foi ali, na simplicidade de uma fita gravada, que começou uma revolução cultural e musical.

Com uma televisão que exibia clipes de bandas como Metallica, Slayer e Kreator, a loja foi o primeiro contato de muitos jovens com o cenário internacional. Mais do que vender música, a Rock House plantou as sementes da cena underground em Brasília, fomentando o surgimento de bandas e fortalecendo o amor pela música alternativa.


Devil Discos (Conic): O Berço do Rock no Conic

A Devil Discos, inaugurada por volta de 1989/90, foi uma loja contemporânea da Rock House, mas com um enfoque diferente: ela se especializou em punk e hardcore. Localizada no Conic, a Devil foi essencial para transformar o local em um centro de diversidade musical.

A loja era uma filial da gravadora paulista de mesmo nome, trazendo para Brasília um vasto catálogo de materiais alternativos que iam além do metal, incluindo discos e zines que alimentavam o cenário punk. Sob a liderança de Gilmar Santos, fundador da banda ARD, a Devil Discos inaugurou um novo capítulo para a cena underground candanga, fazendo do Conic um ponto de encontro vital para músicos e fãs.


Head Collection (Conic): O Termômetro da Cena

Pequena em tamanho, mas imensa em relevância, a Head Collection foi um marco nos anos 90. Conhecida por sua atmosfera acolhedora, a loja se tornou um termômetro da cena underground, informando sobre as demos lançadas, bandas em ascensão e novidades do rock alternativo.

Com a presença de figuras como Míria Gomes, sempre sorridente, e Felipe CDC, uma verdadeira enciclopédia do underground brasiliense, a loja era um ponto de referência para a troca de ideias e materiais. Era ali que fãs e músicos se encontravam para discutir lançamentos, comprar camisetas e zines locais e fortalecer a cena alternativa de Brasília.


Subway (Conic): A Divisora de Águas

A Subway, fundada no início dos anos 90 por Eduardo de Castro, foi mais do que uma loja: foi uma máquina de inovação. Com raízes em Goiânia, Eduardo trouxe para Brasília a mentalidade do “faça você mesmo”, criando uma produção própria de camisetas e estabelecendo a Subway como um dos pilares do underground candango.

A Subway foi fundamental para a consolidação da cena local, organizando a ACB Rock, associação que conquistou o icônico Buraco do Rock, espaço que se tornaria palco de eventos históricos. Além disso, a loja fundou o primeiro selo fonográfico de Brasília voltado para metal e punk, possibilitando o lançamento de bandas como Valhalla, Flesh Temptation e HC 137.

Eduardo foi ainda mais longe, produzindo o EP “My Brazil” do ARD e o projeto audiovisual Terapia, que registrou videoclipes de bandas locais, levando o rock candango a um novo patamar. Com tantas contribuições, a Subway se tornou um divisor de águas na história do underground brasiliense.


Um Legado Eterno

Essas lojas foram muito mais do que negócios: foram catalisadoras de uma revolução cultural. Elas conectaram gerações de músicos, fãs e empreendedores, transformando Brasília em um dos polos underground mais importantes do país.

Hoje, mesmo que muitas dessas lojas não existam mais fisicamente, sua memória e legado permanecem vivos. A cena rock de Brasília é o que é graças à coragem e à paixão daqueles que ousaram abrir portas para o desconhecido.

À Rock House, Devil Discos, Head Collection, Subway e tantas outras que fizeram parte dessa história: nossa eterna gratidão. Vocês não foram apenas lojas; vocês foram faróis em um mar de incertezas, guiando uma geração inteira pelo caminho do rock e da resistência cultural.

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